terça-feira, 4 de agosto de 2009

MANUELA PARTE 1


Numa dessas noites em que o bar estava lotado e o cheiro de cigarro exalava forte sob uma névoa de fumaça que mal deixava enxergar a cantora de jazz que ignorava todo o ambiente e se entregava elegante a uma de suas canções preferidas acompanhada de um piano ao fundo, Manuela apareceu e se sentou a uma mesa próximo a porta principal. Eu estava perto do palco e disposto a apreciar a cantora, mas a imagem de Manuela sentada ao fundo, vestida com um discreto longo cor de rosa e um olhar mais azul do que o mar tirava minha concentração. Havia tempos que eu não a via pelo bar. Para ser sincero, desde o dia em que nós nos amamos num motel barato que ficava na mesma rua do bar. Me lembro que ela prometera voltar na noite seguinte, quando ainda estávamos embalados sob os lençóis com forte odor de almíscar. Deitado ao lado dela, vi o perfil de um rosto delicado com uma alvura serena e satisfeita, de quem se entregou aos prazeres carnais sem se importar com os exageros ou pudores, se sujeitando inclusive a prolongar o momento até o amanhecer se não fosse seu compromisso conjugal que lhe obrigava a voltar para os braços do marido. O qual só fui ter conhecimento momentos antes de deixarmos o quarto ainda quente de desejo.
Nem sei se seu nome Manuela condiz com a verdade já que quem é capaz de omitir um casamento e trair também é capaz de mentir descaradamente, inventando um nome qualquer.
De onde eu estava, via a sua imagem refletida por um dos espelhos do bar. Ela me procurava entre os homens que ocupavam as demais mesas, não tinha me visto ainda, pelo menos foi o que eu pensara. Seus olhos azuis e brilhantes buscavam atentamente um rosto, que de certo seria o meu. Mas o meu nervosismo fez com que eu me escondesse atras de uma garrafa de uísque. Tímido e sorrateiro, deixei de lado o meu interesse pela intérprete de “Summertime” e me pus a observar os mínimos gestos de Manuela, desde sua mão direita segurando levemente o queixo enquanto o olhar desliza vagarosamente pelas mesas, fixando vez ou outra numa figura masculina que ali estava. Pensei por um momento em me mostrar levantando o pescoço e lhe dando um aceno, mas meu orgulho não deixou. Talvez se eu jogasse algo no chão e me levantasse para pegar ela me enxergaria e me chamaria. O problema é que eu sou medroso e não tentei nenhuma das tentativas, fiquei paralisado, olhando pelo espelho, sem sequer perceber o copo de uísque que estava quase vazio.
De súbito tive uma surpresa. Manuela sorriu. Seus lábios se abriram com uma tenuidade sofisticada, seu olhar se comunicou com um outro mancebo de terno marrom escuro e rosto espinhoso. Lentamente ela se levantou e deixou o bar, balançando as nádegas que se desenhavam pela cor rosa de seu vestido e segundos depois o homem também saiu. E eu, sem me importar com a cantora ou com qualquer outra coisa me levantei e saí do bar na tentativa de ver o encontro.

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